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segunda-feira, 8 de abril de 2013

A pior seca dos últimos 60 anos

Uma avaliação comparativa dos efeitos da seca no Nordeste.

Na semana passada estava assistindo o Jornal Nacional, coisa que faço raramente, portanto não acompanho muitas “séries de reportagens”. Pois bem, naquela ocasião vi uma reportagem sobre a atual seca do Nordeste. Naquele momento fiquei tocado, afinal nas raras vezes que fiquei sem água em casa já achei o caos.
Depois comecei a pensar melhor sobre o assunto e me lembrar de outra seca marcante na minha memória. A do início dos anos 80. Naquela época, houve uma reportagem memorável no Fantástico (de 1983) em que o repórter João Batista Olivi, chora ao entrevistar um menino que encontrava força e esperança para brincar mesmo numa situação como aquelas. Lembro também das campanhas para arrecadar fundos para os flagelados da seca. Procurei no Youtube o vídeo da reportagem, e nele também aparecem as tão famosas “frentes de trabalho” (uma maneira dos governos darem emprego àqueles que tinham perdido tudo).
Seca de 1983

Comparando as duas reportagens, com exatos 30 anos de diferença, uma coisa ficou clara: a situação do povo melhorou muito. Não, não pensem que enlouqueci ou que estou fazendo alguma apologia política para o partido A ou B. Se têm dúvida, vejas as reportagens. Em 1983 as crianças choravam de fome, as mães choravam por não terem o que dar de comida para os filhos, não havia água nem para beber, muita gente morreu de desnutrição, o gado morria de fome... Pois bem, apesar da seca de 2013 ser a “pior dos últimos 60 anos”, isso dito pelo Secretário de Recursos Hídricos de Pernambuco, Almir Cirilo, a grande reclamação hoje é a perda do rebanho de gado. Nas palavras do agricultor Magno Moura, segurando o choro: “Ninguém pode analisar a dor de um nordestino que perde seus animais. É duro demais. Só quem está aqui, no dia a dia, vendo eles morrendo aos poucos, sabe". Na mesma reportagem aparece a dona de casa, Maria Jo, cuja maior reclamação era a pouca água disponível, e comentava a falta que ela sentia de um banho de chuveiro.
Pior Seca dos Últimos 60 anos

Pior Seca dos Últimos 60 anos

Pior Seca dos Últimos 60 anos

A diferença é gritante, a fome já não mata as pessoas, somente o gado. A água, de uma forma ou de outra vai até elas e a migração já não é tão grande quanto em outras épocas.
Para quem ainda ficou em dúvida, aconselho a lerem o livro “Holocautos Coloniais”. Li este livro há uns 8 anos e foi como um soco no estomago. Nele o autor analisa períodos de seca entre 1875 e 1900 em três localidades: China, Índia e Nordeste Brasileiro. Ele demonstra que os períodos de seca são cíclicos e globais, fortemente influenciados pelo fenômeno “El Niño”. Ou seja, quando houve grandes secas no Nordeste, também houve em outros locais do mundo. O livro demonstra claramente a ocorrência das secas e a correlação estatística entre vários fenômenos. Além disso, mostra a terrível realidade da morte por fome de mais de 30 milhões de pessoas, num período de 25 anos nesses três locais. No Brasil ele estima entre 1 e 2 milhões de mortos. Numa citação ele diz que “durante 1877 e 1878, a mortandade no Ceará foi provavelmente perto de 500 mil, ou mais da metade da população”. A conclusão do autor é de que todas essas mortes poderiam ter sido evitadas se o imperialismo comercial daquela época não tivesse sido tão intenso.
Ainda bem que as coisas estão bem melhores.

FONTES:
- Holocaustos Coloniais – Mike Davis – Ed. Record – 486 p.

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