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quarta-feira, 20 de maio de 2015

Corrupção e Obras Públicas - Como eu aprendi sobre Cartel

Da série "Corrupção e Obras Públicas". Você pode entender como fantasia ou ficção, eu só conto o que eu vi, ouvi e vivi. Será?

Fonte: Wikipédia
Eu ainda não era formado, mas já trabalhava no ramo com carteira assinada. É bem verdade que só ganhava um salário mínimo, numa época que ele valia bem menos do que hoje. A vantagem é que ia a pé para o trabalho e podia continuar na faculdade. Era um sábado qualquer, e estávamos só eu e um colega que já trabalhava na empresa há mais de 15 anos. Tínhamos que entregar um trabalho para segunda-feira. Naquela conversa amistosa, não sei ao certo o porquê, ele resolveu contar alguns “segredos” da empresa. Normalmente coisas bobas, mas que ele achava importantes. Queria impressionar um novato (no caso eu) com o tanto que ele sabia do mercado.


De todas as coisas que ele me falou e mostrou, só uma delas eu lembro bem até hoje. Era a cópia de uma folha datilografada onde constavam um pequeno texto. Nele havia um compromisso de fazer uma espécie de “rodízio” de vencedores de licitações num determinado órgão público estadual. Abaixo do texto vinha uma lista numerada, em sequência, onde constavam os nomes de cada empresa (cada uma com o seu número) e o nome do representante de cada uma delas. Não havia assinaturas, mas, conforme me confidenciou o colega, a empresa tinha uma cópia assinada no cofre.

Eu já sabia o que vinha a ser um cartel, só que para mim era só uma coisa dos livros. Foi a primeira vez que eu tive diante de uma comprovação, mesmo que tênue já que não vi as assinaturas, da existência de cartel nas empreiteiras de obras públicas. Isso há mais de 25 anos. Fiquei muito espantado e incomodado. Para o meu colega, aquele documento era uma espécie de seguro no caso de uma ameaça de demissão. Pelo menos ele acreditava nisso. Para mim foi só motivo de revolta. Mas essa era a realidade do mercado. Não era preciso estar envolvido diretamente com a ilegalidade, mas ela existia, quisesse eu ou não.

O esquema era simples, cada licitação seria vencida por uma das empresas da lista. Uma de cada vez, na sequência. Outras entrariam na concorrência somente para “dar cobertura”, apresentando preços maiores. Os orçamentos já vinham da empresa que estava indicada para vencer. A nossa única tarefa era maquiar a formatação das planilhas, majorar alguns preços para ficarmos acima da vencedora pré-determinada e colocar o logotipo da empresa. Era comum até o representante da vencedora levar os envelopes das concorrentes para serem entregues nos órgãos públicos. Se a obra fosse grande demais para apenas uma das empresas arcarem, as regras mudavam. Só que eu já não lembro dos detalhes.

Já não trabalho mais no ramo há mais de 15 anos, então não sei mais se existe esse tipo de coisa. Isso é o que eu gostaria de acreditar. Porém, vendo as notícias diárias, vejo que muita coisa continua igual.

Fontes:

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