Uma crítica à obsessão com a perfeição estética.
Era de tarde num sábado qualquer de 1983, fui sozinho, como quase sempre, ao antigo cinema São João no Centro. Não sabia nada sobre o filme, mas saí balançado do cinema. Foi assim a primeira vez que vi "Blade Runner". Era um filme muito diferente das ficções científicas da época, muito mais denso. Bem, com o tempo o filme se tornou um dos maiores "Cult Movies" da história. Bom eu poderia comentar sobre os diversos aspectos éticos e morais da trama, sobre a estética revolucionária da direção de arte, da inesquecível trilha sonora ou sobre a perfeita sintonia do elenco com a direção. Só que não vou falar sobre nada disso, vou falar sobre Engenharia Genética, a base do roteiro.
Naquela época a Engenharia
Genética era só um sonho. O conhecimento dos genes estava avançando e o
sequenciamento de DNA ainda estava sendo desenvolvido. Ainda assim o filme
imaginava um mundo em que, em 2019, a manipulação genética esteja tão avançada
a ponto de se criar androides orgânicos (os replicantes). As formas e
comportamentos desses eram especificamente desenvolvidos para as atividades
fins aos quais eles se destinavam. Por exemplo, havia um replicante de
“brinquedo” que tinha um enorme nariz.
Pois é, há poucos dias estava num
corredor de um prédio comercial e cruzei com uma bela jovem com um grande
curativo no nariz. Claramente a moça tinha feito uma rinoplastia. A
naturalidade que a menina ostentava as marcas recentes da cirurgia, me fez
pensar sobre a banalização da cirurgia plástica, especialmente no nariz.
Eu não sou um radical contra as
cirurgias plásticas, nem mesmo as estéticas. Lembro que li no livro “A
Assustadora História da Medicina”, do qual já falei em outro post que a cirurgia plástica começou exatamente com a rinoplastia. Na Índia antiga,
alguns crimes eram punidos com a amputação do nariz (terrível isso), e assim
nasceu a solução com técnicas bem primitivas, mas, eficientes. Por outro lado, condeno
qualquer tentativa de busca da perfeição estética. Sou daqueles que acham que
perfeição rima com obsessão.
Quantas pessoas que conhecemos e
que achamos que têm um corpo totalmente normal, mas que insistem em modificá-los
através cirurgias? Tenho uma colega que tinha o nariz normal e fez uma plástica
e ficou com o nariz bem estranho. Depois ela fez uma segunda cirurgia e deixou
mais estranho ainda. É claro que eu sei que tem gente que tem problemas
estéticos sérios e outros que têm grande dificuldade de se aceitar do jeito que
são, e que, para esses, a cirurgia plástica pode fazer milagres na autoestima. Mas,
para grande parte, não faz a menor diferença.
Coloquei no Google as palavras “nariz
perfeito”, a resposta foi de vários sites com frases como: “conheça a fórmula
do nariz perfeito”, “em busca do nariz perfeito”, “segredos para um nariz
perfeito”, “modelo de nariz ideal para cada tipo de rosto”, “como ter um nariz
perfeito”, etc. Eu me pergunto, por que ser perfeito? Não é, justamente, a
imperfeição que leva à evolução das espécies? Os padrões estéticos não variam
no tempo e no espaço? Será que existe algum tipo verdadeiro de perfeição, mesmo
que moral?
É, talvez, na verdade, seja eu
que estou ultrapassado. Talvez, no futuro, a manipulação genética possa criar
pessoas esteticamente perfeitas. Talvez a maior conquista da engenharia
genética não seja acabar com a hemofilia ou com a anemia falciforme (que levou
tão cedo a minha amiga Mônica), mas sim criar o humano esteticamente perfeito,
a começar pelo nariz perfeito.
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Nariz da Sean Young |
A coleção de fotos de narizes acima são todas de Sean Young a eterna replicante Rachael, de “Blade Runner”. Considero o nariz dela um dos
mais bonitos (eu não disse “perfeitos”) da história do cinema. Só não posso
garantir a “autenticidade” dele.
FONTES:
Sites sobre "narizes perfeitos":
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