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domingo, 28 de abril de 2013

Sacrifícios Humanos na Nossa Sociedade (ou Os Tubarões e o Cabeleireiro)


Sobre as mortes violentas e a nossa apatia diante delas.


Quando assisti pela primeira vez o filme “Tubarão” (de 1975 dirigido por Spilberg), fiquei muito impressionado. O filme é um clássico do suspense/terror, bom ainda para os espectadores de hoje. O elenco e a direção são ótimos, e o roteiro não deixa a desejar. Tem um monólogo do personagem Samuel Quint (vivido por Robert Shaw) que me marcou para sempre. Ele relatava ser um sobrevivente de um naufrágio no finalzinho da 2ª Guerra Mundial. Depois que o navio afundou, os sobreviventes ficaram flutuando no mar, esperando pelo salvamento. Durante os 5 dias de espera, o cardume de tubarões que envolveu o grupo, pegava um marinheiro a cada 15 minutos. Todos ficaram afastados uns dos outros e torciam para que não fossem os próximos. Cada vez que houviam um grito de morte, sentiam, ao mesmo tempo, um alívio por não serem eles e a dor de perderem um companheiro.

Mais tarde vim saber que a história era baseada em fatos reais, e fiquei chocado. O USS Indianápolis tinha 1.196 tripulantes e foi torpedeado pelos Japoneses no Pacífico. Dos 880 que se salvaram do afundamento, apenas 317 marinheiros sobreviveram aos tubarões.
Esta história sempre me fez pensar em quantas vezes lemos as notícias de mortes violentas, em especial no trânsito ou por homicídios. E quase sempre nos consolamos pelo fato de, “pelo menos”, não ser ninguém das nossas relações. Estas pessoas se transformam em números das estatísticas da violência.
Estatística Mortes Violentas
http://poucodemorais.blogspot.com/

Com o tempo fui fazendo uma analogia da nossa reação diante das estatísticas e os sacrifícios humanos da era pré-colombiana. Os Maias e Incas, assim como culturas anteriores em várias partes do Mundo, faziam sacrifícios rituais para agradar ou apaziguar os deuses. Cheguei a conclusão que, por mais frequentes que fossem esses sacrifícios, em nenhum momento devem ter afetado o equilíbrio populacional. Ou seja a morte das pessoas só era sentida, pelo menos assim eu imagino, pelos mais próximos. Para os outros era apenas mais um, desde que não fossem eles. Da mesma forma que olhamos as estatísticas de mortes violentas.

Vejo os inocentes acidentados e assassinados, como sendo as oferendas para os sacrifícios humanos da nossa sociedade. Só damos importância quando nos afeta pessoalmente.
Este post é em homenagem ao meu cabeleireiro do qual fui cliente por cerca de 20 anos. Não cortava o cabelo com muita frequência (pois cada vez tinha menos cabelo), mas sempre que nos víamos colocávamos os assuntos em dia. Conversávamos sobre família, filhos, música, teatro, cinema, futebol (torcíamos pelo mesmo time), política, etc. Como manda a tradição dos “barbeiros”. Ele morreu este mês em consequência de um atropelamento. Da última vez que nos vimos, nas vésperas do fim do ano passado, ele, como era o seu costume, mandou um abraço para toda a família e com os sempre otimistas votos de Natal. O ano de 2013 seria de grandes planos, conforme ele me confidenciou. Não deu. Gustavo, para mim tu não é só uma estatística. Obrigado por ter estado na minha vida.

FONTES:

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